O empresário, honesto e civilizado, hoje sofre porque é confundido com o especulador, porque muitos empresários se transformaram, às vezes sem querer, em especuladores, devorados pela síndrome do rendimento. É hora de começar a reconhecer isso e a falar sobre o assunto.
de Luigino Bruni
publicado no dia 04/01/2024 no site Il Messaggero di Sant'Antonio
A economia sempre foi o resultado de uma tensão ou conflito entre lucros e rendimentos, ou seja, entre aqueles que precisam produzir novas receitas para receber no presente, e aqueles que ganham hoje com a riqueza acumulada ontem e por gerações passadas. Os empresários vivem de lucros, os especuladores de rendimentos. A crítica radical à usura que encontramos na Bíblia e no Evangelho (de Lucas) tem sua raiz em uma profunda aversão aos rendimentos. A usura, em um mundo essencialmente estático como era o antigo, é de fato uma forma de rendimento, ou seja, uma renda que surge do mero fato de deter o poder sobre um meio fundamental ( o dinheiro). Não há trabalho por trás da usura, apenas poder e privilégio. A crítica à usura atravessou toda a Idade Média e a Contrarreforma, porque estava ligada à crítica da Igreja às anuidades, embora os próprios eclesiásticos fizessem parte da classe lucrativa; uma das muitas contradições da história e também uma das razões para a ineficácia da luta da Igreja contra a usura, uma luta que coexistia com privilégios, inclusive políticos, concedidos aos banqueiros-usurários dos papas.
A tensão entre rendimentos e lucro também é um eixo fundamental para a compreensão de nossa sociedade. A crítica marxista deslocou a crítica social para o conflito capitalista-trabalhador e explicou muito sobre a sociedade industrial. Mas com a economia pós-industrial e a diminuição da importância das grandes fábricas, voltamos ao antigo conflito fundamental entre rendimentos e lucros, ou seja, entre empreendedores e proprietários. Aqueles que hoje continuam a pensar que o conflito fundamental de nosso capitalismo é aquele entre empresários e trabalhadores erram em cheio, porque se esquecem de que o verdadeiro e grande conflito é aquele entre os rendimentos e todas as outras formas de renda (inclusive os salários dos trabalhadores). O crescimento dos rendimentos está esmagando para baixo tanto os lucros dos empresários quanto os salários dos trabalhadores: "Surge então outra subdistinção de classes sociais, moldada na distinção do capital em produtivo e improdutivo: a dos capitalistas produtivos, dedicados exclusivamente à indústria, e a dos improdutivos, dos banqueiros que não aumentam a riqueza social, mas especulam sobre valores, formando sua renda por meio da retirada dos rendimentos de outros" (A. Loria, La sintesi economica, 1910, p. 211).
Mas onde o conflito entre rendimento e lucro se expressa hoje? Em muitos lugares. O primeiro que me vem à mente é a grande finança especulativa, os grandes fundos de investimento que estão substituindo os empresários na propriedade e no controle de suas empresas, vendidas, nos anos difíceis que vivemos, às ofertas irresistíveis de fundos anônimos, sem rosto e muitas vezes sem alma. A tributação reforça a ditadura dos rendimentos, porque a política estabelece impostos sobre os rendimentos muito baixos em comparação com os impostos sobre o trabalho. Atualmente, uma forma nova e subvalorizada de rendimento é a consultoria. De fato, a consultoria prestada por grandes corporações globais se apresenta como uma taxa sobre os empreendedores, porque a dependência (vício) artisticamente criada nos últimos anos (a autonomia das corporações agora se tornou quase nula) significa que grande parte dos lucros acaba nas várias formas de consultoria que são apresentadas como essenciais e necessárias. E, como acontece com todas as formas de dependência, elas exigem que a dose de dependência seja aumentada a cada dia. O empresário, honesto e civilizado, hoje sofre porque é confundido com o especulador, porque muitos empresários se transformaram, às vezes sem querer, em especuladores, devorados pela síndrome dos rendimentos. É hora de começar a reconhecer isso e a falar sobre o assunto.
Créditos foto: © Giuliano Dinon / Arquivo MSA