O Papa acolheu, no Vaticano, 1100 representantes da Economia de Comunhão, entre os quais 22 portugueses, a quem deixou louvores e desafios.
por Teresa Costa
publicado em: https://www.dinheirovivo.pt no 08/02/2017
“Estes 25 anos da história da Economia de Comunhão confirmam que a comunhão e as empresas podem crescer lado a lado. Comunhão é a multiplicação dos bens para todos. A economia de hoje precisa da alma dos empresários e da fraternidade respeitosa e humilde. É preciso compartilhar mais os lucros para combater a idolatria do dinheiro”, disse Francisco.
Em Portugal, falamos com um dos empresários ligados a este movimento que privilegia a gratuitidade e a reciprocidade.
“Por exemplo, se ganhamos um cliente, significa que privamos outra empresa de o ter. Então, se não dermos um sentido a esta nova conquista, significa que foi inglória. Daí querermos partilhar os lucros e estimar as pessoas”. António José Lopes prossegue: “Podemos dar emprego a pessoas que até seriam dispensáveis, mas sabemos que temos de fazer uma intervenção na sociedade”.
E mais duas situações: “Um trabalhador, na altura em que ia para a reforma, enviuvou. A empresa decidiu mantê-lo no trabalho, para evitar que o homem fosse para casa e sentisse uma dupla solidão. Outro trabalhador foi despedido, com justa causa, mas a empresa decidiu continuar a dar-lhe emprego até ele arranjar outro trabalho, uma vez que ele era a única fonte de sustento da sua família”.
O empresário, sócio com mais dois irmãos da empresa Faria & Irmão, L.da, clarifica que uma empresa tem de ter trabalhadores, fornecedores, clientes, equipamentos e sobreviver como qualquer outra, mas assinala a diferença: “Nós damos um valor mais acentuado às pessoas”. "O raciocínio é: “Se eu estiver do outro lado, o que é que eu gostaria que fosse feito?"
Assume que a ética e os princípios da Economia de Comunhão estão contra as regras atuais de funcionamento do mercado. “Mas até temos retornos imprevisíveis. Olhe, estas práticas não nos impedem de sermos líderes no mercado”, com a produção de formas para a indústria do calçado, empregando cerca de 60 pessoas e com unidades em Leiria, S. João da Madeira e Felgueiras.
O lucro é relativizado: “Não é só dinheiro”. Mas, chegados até aqui, António José Lopes vai buscar as palavras da fundadora do movimento, Chiara Lubich, para sintetizar: “De que vale uma empresa ter lucro se ele for resultado de uma atividade desumanizada?”
Em Portugal, a Economia de Comunhão faz o seu percurso desde praticamente 1991, associada ao Movimento dos Focolares. Tem mais expressão na região Centro, em especial, Lisboa, Leiria e Alenquer, onde está instalado o Polo Empresarial de Economia de Comunhão, na freguesia de Abrigada. Há 18 empresários portugueses vinculados por opção a este modo de gerir. Têm 14 empresas, de vários setores de atividade – consultoria, contabilidade, construção civil, agrícola, distribuição de produtos e equipamentos para análises clínicas, moldes para calçado, uma clínica médica e de diagnóstico – e, no total, empregam 550 pessoas.
Mas o modelo já apaixona jovens empreendedores e Portugal até figura entre os cinco “Hubs”, em tradução livre nós, ligados à Incubadora Internacional em Rede de Economia de Comunhão, também designada por EoC-IIN. Presente em todos os continentes, visa oferecer serviços no processo de incubação de empresas, sempre na lógica da cultura do dar, em detrimento da cultura do ter. O Hub português, ainda em fase de arranque, já proporcionou um Bootcamp de Empreendedorismo de Comunhão, no ano passado, para incubação de ideias de negócio e projetos sociais. A experiência foi dada a conhecer agora em Roma, no âmbito do Congresso Internacional da Economia de Comunhão, e, segundo os representantes portugueses que nele participaram, “suscitou muito interesse” para ser “replicado noutros países”.
Impacto Social
Do lado da dádiva, o movimento português da Economia de Comunhão apoia um projeto social denominado RAISE – Resposta Alternativa de Inserção Social e Empreendedorismo, que visa diminuir o desemprego, em particular, no concelho de Alenquer, pela via da capacitação das pessoas, tanto para a inserção no mundo laboral por contra de outrem ou como pela criação do próprio emprego. Nesta ação conta com o apoio da AMU- Cooperação e Solidariedade Lusófona por um Mundo Unido (ONGD e IPSS).
A nível mundial, a Economia de Comunhão envolve mais de 800 empresas e, além de contribuir para reverter situações de pobreza, introduz uma nova cultura económica que tem suscitado interesse mesmo no mundo académico.
“Os desafios que o mundo atual nos coloca são muitos deles devidos a uma economia que divide e que exclui. A Economia de Comunhão tem uma proposta concreta a fazer à sociedade atual e quer trabalhar nesse sentido”, sustenta a Associação para a Economia de Comunhão, liderada por José Maria Raposo, reforçando que “existe um grande desejo de crescimento, aprofundamento e de abertura a outras realidades e iniciativas que trabalham por uma economia capaz de contribuir para a construção de um mundo mais justo”.