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Os efeitos do Coronavírus na economia global

Os efeitos na Itália e no mundo devido à desaceleração das cadeias de produção de mercadorias relacionado à paralisação na China. A oportunidade de repensar em novas estratégias à longo prazo. 

por Tommaso Reggiani

publicado na revista Città Nuova em 27/02/2020

Com uma economia italiana já aflita, o pânico gerado pelo Coronavírus certamente representa uma surpresa não muito boa para Itália. O volume da economia já havia contraído 0,3% de declínio no último trimestre do ano passado - o índice mais acentuado nos últimos seis anos - e com isso, o impacto do Coronavírus provavelmente acentua essa tendência negativa. Com cerca de 125 milhões de chegadas turísticas anuais - divididas igualmente entre turismo interno e turismo internacional - o volume de negócios gerados pelas visitas externas soma cerca de 42 bilhões de euros, o equivalente a 6% do PIB do país. E com as medidas adotadas durante esses meses, o setor turístico fica extremamente sensível ao Coronavírus. O alarmismo dos dias de hoje contribuiu para que a bolsa de Milano caísse quase 5%, um valor que não é registrado desde junho de 2016.

Se o setor financeiro enxerga um cenário cinza, a economia cotidiana certamente não sorri. Até a presente data, a maioria dos casos críticos e de consideráveis restrições concentra-se entre Lombardia e Vêneto, duas regiões que sozinhas constituem aproximadamente um quarto de toda a economia italiana. Essas duas regiões abrigam uma parcela extremamente significativa de empresas exportadoras e concentradas em produtos de alto valor agregado, com base em uma cadeia de produção altamente internacionalizada.

É nesse segundo ponto que entra em jogo a questão China, atualmente o país mais exposto ao Coronavírus, assim como é um ponto de referência em relação a cadeia de suprimentos (cadeia de distribuição de produtos) em nível mundial. A dependência da China, das indústrias ocidentais, pelo alto valor agregado é extremamente evidente. Basta pensar na fibra de carbono para os chassis das “bergamaschissime” bicicletas brancas, ou então nas resinas para as armações de óculos ultraleves da Luxottica em Beluno, isso apenas para dar dois excelentes exemplos de lombardos-venezianos. Se as fábricas na China fecharem ou desacelerarem as suas atividades, em poucas semanas as empresas europeias e norte americanas ficarão sem suprimentos adequados para a própria produção.           

Logo, existem três motivos para acreditar que os próximos meses poderão se revelar ainda mais desagradáveis para muitas empresas, especialmente para aquelas mais desenvolvidas e internacionais. 

Primeiro, as grandes multinacionais se deixaram perigosamente expostas ao risco das cadeias de suprimentos, com estratégias projetadas apenas para a redução de seus custos. Por exemplo, muitas têm apenas suprimentos suficientes para suprir a produção por algumas semanas, confiantes de que sempre poderão reabastecer o estoque “just-in-time” (pedidos expressos extremamente flexíveis) economizando nos custos de armazenamento.

A segunda vulnerabilidade deriva do fato que hoje as grandes empresas dependem muito mais das fábricas chinesas do que em 2003, na época da epidemia Sars. A China, hoje representa 16% do PIB mundial, em comparação aos 4% da época. A sua quota de participação na exportação de produtos têxteis e de roupas chega a 40% do total global. Também circula 26% da exportação mundial de móveis. Mas não é apenas o aumento da dimensão da base industrial chinesa que é importante. Desde 2003, as fábricas se expandem da costa até as regiões internas mais pobres como Wuhan, onde surgiu a epidemia. Hoje, os trabalhadores dessa cidade trabalham nas fábricas espalhadas por toda a China e viajam muito mais do que antes, aumentando o risco de propagação interna de vírus. 

O terceiro motivo que nos leva a pensar que as empresas mais desenvolvidas possam sofrer um choque na cadeia de suprimentos é o fato que as regiões mais atingidas pelo covid-19, e subsequentes bloqueios governamentais, são particularmente importantes para as diversas industrias mundiais. O setor eletrônico é aquele que se encontrar em maior risco, devido ao seu estoque relativamente pequeno e à falta de fontes alternativas para o fornecimento de componentes. A província de Wuhan é o coração do “vale das fibras óticas", sede de muitas empresas que produzem componentes essenciais para as redes de telecomunicações. Cerca de um quarto dos cabos e dos dispositivos de fibra ótica do mundo são fabricados lá. Ali também se encontra uma das instalações de fabricação de chip mais avançada da China, que produz a memória utilizada nos smartphone. Os analistas temem que a epidemia possa reduzir as expedições em 10% neste ano. A indústria automotiva –  e todas as suas fabricações – também foi afetada. A falta de peças de reposição pela parte dos fornecedores chineses forçou a Hyundai a fechar todos as suas fábricas de automóveis na Coreia do Sul (agora já as reabre parcialmente). Nissan fechou uma temporariamente no Japão, e a Fiat-Chrysler alertou que poderá cessar em breve a produção de uma das suas fabricas na Europa. 

À longo prazo, a epidemia pode diminuir a dependência de suprimentos da China.  As grandes empresas especularam há muito tempo que as cadeias de suprimentos internacionais da China eram muito confiáveis e fáceis de administrar. Recentemente, estudos revelam que apenas uma minoria de empresas avalia adequadamente os seus riscos quanto a cadeia de suprimentos. Durante anos, os conselhos das empresas transferiram a responsabilidade desses suprimentos, aos gerentes de nível médio com a única incumbência de reduzir os custos em um ou dois percentuais a menos que os custos do ano anterior. A epidemia do covid-19 está ressaltando os riscos dessa política, que visa o aumento míope dos lucros, sem considerar estratégias mais complexas capazes de responder ao crescente grau de incertezas e variabilidade que caracteriza a nossa época.

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